terça-feira, 13 de março de 2012

Two Targets, Two Instruments

Dia 29 de fevereiro, 3 economistas do Fundo Monetario Internacional (Jonathan D Ostry, Atish R. Ghosh and Marcos Chamon) divulgaram um paper com o titulo Two Targets, Two Instruments: Monetary and Exchange Rate Policies in Emerging Market Economies. Tomei a liberdade de utilizar o titulo abreviado para este e-mail.

Lendo o texto, parece que ele foi contratado pelos autoridades brasileiras para justificar a queda da SELIC sem prejuízo do sistema de metas de inflação e a intervenção no câmbio para conter a apreciação do real. Ainda que não seja opinião do FMI, o texto foi “Authorized for distribution by Olivier Blanchard”.

(
http://www.imf.org/external/pubs/ft/sdn/2012/sdn1201.pdf)

“If EME central banks worry about currency movements away from medium run levels (which, we argue, they typically do), then an IT-cum-sterilized-FX-intervention regime may provide the best of both worlds: the discipline of IT with the exchange rate responsiveness of a managed float.”

Os economistas argumentam que a persistência é um importante parâmetro entre a escolha de intervenção no câmbio e utilização de juros para conter o fluxo de capital. Quando o fluxo é temporário, a intervenção funciona melhor. Se o fluxo se mantiver persistente, os juros precisarão ser reduzidos mais que o necessário. Olhando a decisão da semana passada de corte de 0,75% poderíamos inferir que finalmente as autoridades brasileiras se deram conta de que o fluxo de investimento tende a ser mais persistente e passarão a utilizar o canal dos juros como complemento às intervenções no cambio? Parece que sim.

“... when the shock is more persistent, the policy interest rate will be lowered by more, thus playing a larger role relative to FX intervention. This accords with the usual intuition that the authorities should allow the economy to adjust to permanent shocks (including capital inflows) but intervene to absorb temporary shocks that move the economy away from its medium-term equilibrium.”

Além disto, argumentam que o BC não deveria especificar um nível para o cambio, do contrario poderia incentivar os agentes a tomarem posições de carry trade. “... if the central bank is perceived as defending a specific parity, this could encourage greater carry trade to take advantage of interest rate differentials (since downside risk for investors would be limited).”

Como conclusão, os autores apontam que a utilização de intervenções no cambio longe de prejudicar o regime de metas, contribui para a percepção dos agentes de que as autoridades estão comprometidas em manter a inflação sob controle.

“When the central bank is seeking to entrench its commitment to low inflation in the eyes of the public, a two-instrument IT framework may yield significant benefits. ... In response, for instance, to a destabilizing increase in capital inflows, the central bank can both lower the policy rate and intervene in the FX market to limit appreciation, in much the same way as it would do under unconstrained full discretion, but while avoiding the inflationary bias that would otherwise result from discretionary policies. Far from being reticent to use the second instrument, central banks should embrace its use as being fully consistent with the IT framework.”

E assim, “Dando seguimento ao processo de ajuste das condições monetárias, o Copom decidiu reduzir a taxa Selic para 9,75% a.a., sem viés, por cinco votos a favor e dois votos pela redução da taxa Selic em 0,5 p.p.”

Novamente, o mercado foi “surpreendido” como ocorreu em agosto de 2011. Na sexta-feira anterior ao COPOM, noticia no Valor mostrava que todas as casas consultadas previam queda de 0,5pp. Entretanto, a curva de juros já apresentava apostadores acima de 0,5% na quinta-feira, depois do anuncio do ECB sobre mais meio trilhão de euros para os bancos e dos discursos de diversas autoridades do governo. De segunda a quarta a curva foi ganhando novos apostadores até chegar a quase 70 bps na quarta-feira a tarde. Ao final do dia, o COPOM anunciou a queda de 0,75%.




No domingo a noite (12/03), o mercado foi “surpreendido novamente” com a noticia de que o prazo foi prolongado de 3 para 5 anos para o IOF nos empréstimos exterior. E com toda surpresa o USD chegou a 1,83. Os instrumentos de política monetária e cambial do governo parecem não ter fim. Qual o limite de intervenção? Ninguém sabe. Por enquanto, acho que o governo deve aguardar e ver como o mercado vai reagir às medidas divulgadas recentemente mas está claramente pronto para intervir sempre que a moeda entrar em uma zona de desconforto. Como falamos no começo deste ano, “keep your eye on the ball”.

Enquanto FHC ficou conhecido como responsável por acabar com a inflação e Lula como o pai dos pobres (aumento expressivo da classe C), Dilma quer ficar conhecida como a responsável por derrubar os juros no Brasil. A questão dos juros é um dos grandes paradigmas da economia brasileira e se olharmos o mundo há espaço para quedas adicionais em um contexto desinflacionario de curto prazo, ainda que existam preocupações relevantes com a inflação no médio prazo em virtude do tamanho “nunca antes na historia” dos balanços dos bancos centrais mundo a fora.

Estamos diante de uma mudança no patamar de juros no Brasil? Podemos sentir saudades de uma NTN-F 21 a 11,16% ao ano.

sexta-feira, 2 de março de 2012

"Tsunami Monetário"


Discurso inspirador de nossa presidenta ontem. É por isso que nós nos preocupamos sim com esse tsunami monetário dos países desenvolvidos que não usam políticas fiscais de ampliação da capacidade de investimento para sair da crise em que estão metidos. Nós sabemos que hoje as condições de concorrência são adversas, não porque a indústria brasileira não seja produtiva, mas porque tem uma guerra cambial baseada numa política monetária expansionista que cria condições desiguais de concorrência.” Dilma Rousseff

O Tsunami a que se refere Dilma é a gigantesca
injeção de dinheiro levada a cabo pelos bancos centrais ao redor do mundo. USA, Japão, Inglaterra e União Européia injetaram mais de USD 4,5 tri desde o inicio da crise. Apenas nesta semana o BCE injetou EUR 530 bi no sistema financeiro. Todo este dinheiro precisa ir para algum lugar em busca de rendimento. É difícil o BCB lutar contra toda esta montanha de dinheiro em circulação, mas há muitos instrumentos disponíveis para reduzir a volatilidade no real. Com tanto dinheiro em circulação parece difícil ficar pessimista. O otimismo continua pelo menos pelos agentes atrás dos terminais bloomberg mundo afora. Mas e no mundo real onde as coisas de fato acontecem?


A situação segue difícil. Em 2011 o credito para as famílias e pequenas e medias empresas reduziu na Espanha. As 9 principais instituições financeiras espanholas reduziram em média 4,8% o estoque de crédito na economia, como mostra o gráfico abaixo.


Além disto, os bancos espanhóis e os europeus (em geral) passam por um processo de desalavancagem e ajustes de capital. As concessões de credito vão cair ainda mais mesmo com toda a expectativa de que as linhas do BCE chegariam às empresas e famílias. Além disto, os bancos estão reduzindo de tamanho através de demissões e fechamento de agencias.



Hoje, o Conselho de Ministros da Espanha anunciou o cenário para o ano de 2012: contração do PIB em 1,7%, déficit de 5,8%, corte de 630 mil empregos e taxa de desemprego de 24,3%. Este é o cenario traçado pelo governo. Em geral, governos são otimistas. As coisas não estão muito melhor na Italia que eliminará a isenção que a Igreja tem no pagamento do Imposto de Bens Imoveis. A expectativa é recolher EUR 700MM da Igreja Italiana.


A situação nos outros países europeus não é muito diferente: forte ajuste fiscal, desemprego, ajustes no sistema financeiro, demanda fraca. É difícil manter-se otimista em um cenário destes. Cedo ou tarde, os fundamentos econômicos devem prevalecer. Com isto poderiamos esperar uma queda do EUR frente ao USD abaixo de 1,20? Sabemos que previsões estão fadadas ao erro, mas acho pouco provável terminarmos o ano abaixo deste valor. Lembremos que o FED também está empenhado no enfraquecimento do USD. Além disto, há muitos interesses em jogo. Bancos Centrais, fundos soberanos, empresas européias, governos de outros países, bancos e por aí vai. Por mais que os hedge funds apostem na ponta vendedora, sabemos que a dinâmica do sistema financeiro mundial é extremamente complexa e difícil de ser mapeada.

No curto prazo, tudo indica que as moedas dos países emergentes sofrerão forte pressão de apreciação. O fluxo de dinheiro é enorme e estão vindo em direção aos emergentes. Não dá pra lutar contra por muito tempo. É como alguém cair em um rio caudaloso depois de uma tempestade e querer nadar contra a correnteza. Quanto tempo esta pessoa aguenta? Senão quiser seguir o fluxo das águas, melhor sair do rio e esperar a correnteza acalmar.

Por mais que a tendência seja de apreciação do BRL, os discursos e as medidas anunciadas ontem mostram a determinação das autoridades brasileiras em suportar o BRL a 1,70 ou pelos menos reduzir a velocidade de apreciação da moeda brasileira. Tombini disse com todas as letras que o BC continuará com a estratégia de acumulação de reservas. “O BC nunca abandonou essa estratégia, mesmo nos momentos em que saiu do mercado nos últimos meses. O BC sempre confirmou que, as condições de mercado permitindo ou exigindo, o Banco Central interviria e continuaria com a acumulação de reservas.” É preciso coragem para tomar grandes posições vendedoras em USDBRL neste momento.

All in all, continuo reticente que todo este otimismo persistirá por muito tempo enquanto a demanda não apresentar sinais consistentes de melhora. Não há dinheiro no mundo que force famílias e empresas a consumirem e investirem enquanto incertezas de médio e longo prazo persistirem. E isto leva tempo ...

 
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